quarta-feira, 10 de abril de 2013

As disparidades proporcionadas pelo imaginário


Faz tempo que desejo escrever no blog. Mas foi tanta correria com a finalização do mestrado, que a coisa ficou estagnada por aqui. Findada uma etapa, me caiu nas mãos uma ótima oportunidade para retomada de conteúdo.

Embora o título me tenha sido dado, por questão de mérito, obviamente, não sou mestre em todos os temas. Mas sim, tenho elementos para arriscar certos ensaios, principalmente na área da comunicação.

Na primeira semana do mês de abril, a marca alemã Mercedes-Benz, conhecida mundialmente por atender a demanda da classe A, no que se refere a veículos de passeio, uniu-se ao funk da periferia do Rio de Janeiro. A música “Passinho do Volante”, criada por MC Federado e os Leleks, embala a campanha do novo Classe A, produzido pela empresa, e que custa em torno dos R$ 100 mil. Falamos então da união de uma marca de luxo mundial, com linguagem da expressão popular carioca.

Minha ideia nessa escritura não é ser preconceituosa, mas mostrar a realidade imaginária que percebi ao assistir mais de cinco vezes ao comercial do Classe A e o vídeo original do funk, postado em janeiro desse ano no YouTube. Embora a empresa justifique a corajosa escolha por esse casamento sem semelhança, o que vem a ser a ascensão da Classe C e, ainda, ter como objetivo atingir o público jovem, em especial no Brasil, esse casamento não é possível fora da ideologia. Nesse caso, me baseio no conceito de ideologia proposto por Althusser, que explica que é uma forma de colocar em movimento o imaginário. Ou ainda, colocá-lo em prática.

Vejo, no vídeo da Mercedes, a prática de apresentar uma propaganda que une classes e culturas dispares, mas que não se confirmam na realidade. Por mais que o país, no caso o tropical, esteja conforme dados do governo, avançando economicamente e dando acesso ao consumo mais efetivo da Classe C, um veículo de R$ 100 mil seria um abuso e, quase uma impraticável aquisição. Pelo valor de oferta e, ainda, se pensarmos apenas na realidade cultural dos produtores da canção tema do comercial.

Por outro lado, encontramos apenas o imaginário, ainda em larga escala de atuação, na mente de jovens como MC Federado e os Leleks, que dificilmente teriam acesso, no que se trata de valor, a adquirir um bem desses. E, mesmo que a Mercedes não diga o valor negociado com os jovens para utilizar a música deles em seu produto midiático, creio que dificilmente alcance o valor de um Classe A. E mesmo que chegue, ainda creio que as necessidades mais urgentes desse público não refere-se a compra do automóvel.

Comparando ainda, o vídeo original postado pelo MC e, a propaganda do Classe A, vemos a gritante diferença dos fatos, já perceptíveis sem muito aprofundamento. Porém, o que principalmente chamou minha atenção, refere-se aos veículos expostos nos vídeos. No clipe “Passinho do Volante”, por diversas passagens da dança jovem, é visível uma Kombi em desuso, ao fundo. Já o Classe A, é todo o “Passinho do Volante”, algo inatingível aos jovens protagonistas da arte primeira. É evidente, ainda onde há humanização, a partir da participação coletiva da proliferação cultural popular, e a frieza da máquina dançando a canção popularesca.

Capturei, portanto, a ideia de que o carro é a vida, mas a propaganda mostra a brutal diferença entre classes e os estereótipos que não se unem, mesmo que forçados. Vejo uma Mercedes tentando se mostrar aberta a novos consumidores, sem potencial, e quem sabe deixando uma interrogação em seus consumidores reais. E vejo ainda, jovens como o MC Federado e seus Leleks criarem ainda mais falsas ideias de vida.

Capturo a absorção de uma cultura popular, e falsa postura de igualdade, por parte da Mercedes-Benz, que se utilizou de uma representação social em voga na popularidade da cultura de entretenimento, para lançar um viral. Diga-se que, o compartilhamento e visualização do vídeo da Mercedes foi gigantesco. Porém, existe um objetivo longe do que realmente expõem em suas escolhas por essa temática musical do Classe A. E, percebo ainda, cada vez mais um estimulo para a falsa busca da representação social, por meio do consumo, da parte de quem vive a margem e tem apenas o imaginário inatingível a embalar suas danças.